Esta poesia foi meu pai que criou, ele fala sobre a vida de meu avô (pai dele), já falecido.
Meu pai
Da estirpe Ferreira dos Santos
Nasceu no Barracão
Foi batizado Aristeu
Mudou-se de mala e cuia
Um pouco mais pra diante
E plantou sementes no Marmeleiro
Já agora em campos Ourenses
Foi peão de estância e changueador
Plantando em terras alheias
Como é costume pra um peão
Teve até seus tempos de Zagalo
Treinando um quadro de futebol
Mas já curtido da lida
Do arado, da carreta
E da lavoura de arroz
Resolveu, no seu terrunho nomadismo
Ir se aquerenciar na cidade
Nem tanto pelo luzeiro
Antes, por necessidade
Já então em Cacique Doble
Lutou fabricando tubos,
Carneiras e tudo que diga
Com passagem pra outra vida
Mas o seu nomadismo primitivo
O chamava novamente
E se mandou a la cria
Voltando aos velhos pagos
Até o ofício era o mesmo
Sempre peleando com tanques
Tubos e carneiras
Quando então o destino
Fez-lhe a pior das encomendas
Preparar a última morada
Para a sua própria prenda
O que se há de fazer
Neste mundo velho de Deus
Tocou a vida pra diante
Sabe Deus o que sofreu
Quantos invernos solito
Quantas lembranças se vieram
Mas pelear era preciso
Pra dar coragem pras gurias
E criar toda a piazada
Hoje com mais de oitenta
Já não mateia tanto
Prefere um trago de canha
Mas sem gelo, lhe garanto
Que é pra não se judiar
Já não joga mais sinuca
Perdeu os parceiros do bolão
E fica remoendo lembranças
Na varanda do seu rancho
E de quando em quando
Se chega algum vivente
Ou mesmo alguém da sua gente
Perguntando, após um ... buenas:
- como é que está, seu Aristeu?
Ao que meu velho responde:
- peleando c’os castelhanos
E em arremate: - tô por um fim, mal-e-mal vivo
E proseia, assim do seu jeito
Entremeando silêncios e causos
Causos de todos os naipes
Silêncios de um balanço da vida
Ou talvez ideiando pra si
Como quem diz:
- fiz o que pude, guri!
Por Rui Ferreira dso Santos